Tuesday, October 24, 2023
Tuesday, October 17, 2023
O RIN0CERONTE BRANCO
O rinoceronte branco em boa verdade não existe, ou seja ele existe mas é tão branco como os restantes que são cinzentos.
Atribuição do apelido descolorido resulta de um grande mal entendido.
Os Bôers, que descendem lá dos Países Baixos do Norte da Europa falam uma língua descendente do neerlandês, o AfriKaans.
Os Holandeses chamam a ‘largo’ a estranha palavra “wijd”. Que os Bôers simplificaram para “wyd”.
Chegaram os Ingleses à Africa do Sul e não percebiam patavina daquela língua , mas ouviam os sul-africanos chamarem wyd a esta espécie de rinocerontes, devido â sua boca larga, e entenderam White.
A partir desse momento estes rinocerontes que são acinzentados, ficaram a apelidar-se de brancos apenas porque ostentam uma boca larga.
Este rinoceronte, independente da semântica, está em vias de extinção.
O maior perigo para estes animais vem de longe, da Ásia.
A medicina chinesa, em alguns países asiáticos, usa o chifre do rinoceronte como ingrediente terapêutico há mais 2.000 anos,
Desde a crença de que o chifre ralado e dissolvido em água atribui poderes afrodisíacos à sua utilização para a cura da febre ou a ressaca assim outros tantos distúrbios alimentou a procura do corno do rinoceronte.
Cientificamente o chifre do rinoceronte tem tantos puderes como uma unha do dedo mindinho de um pé.
Para além disso ainda há caça furtiva e a perniciosa lei dos mercados. À medida que diminui o número de rinocerontes mais o seu valor aumenta.
Em alguns países como a Zâmbia, forças militares especiais como os Rangers estão destacados nas reservas nacionais para proteger, dia e noite, estes animais majestosos. E têm permissão usar as suas armas letais quando necessário.
Para estar próximo de um destes animais é necessário procurar os Rangers e onde há um ranger estarão rinocerontes por perto. Ninguém no seu juízo irrepreensível se aproxima destes perissodáctilos sem ter as costas quentes. Isto é, com os Rangers na retaguarda.
Fomos à procura deles. Mato adentro. O que mais encontrámos pelo caminho foram gazelas, depois uns Gnus, também chamados de boi-cavalo, ou wildebeest. É um mamífero ungulado, um bocado para o feioso, que anda gosta de andar acompanhado de Zebras. É uma relação interesseira tipo ‘i scratch your back you scratch mine’ mas na verdade é mais eu vejo por ti e tu cheiras por mim.
E lá estavam elas uns passo à frente a ostentar as suas riscas pretas (ou brancas dependendo do modo em que olhamos para o equídeo.
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(Pouco ou nada se tem talado relatos dos troncos que as árvores deixam após partirem lá para o paraíso delas, mas são presença constante no cenário da savana.
São esculturas naturais, galhos que inventam posições impossíveis, que se cruzam em harmonia.
Naturezas mortas dum quadro real).
Um trilho levou-nos a uma paisagem singular, como se tivermos sido teletransportados para um recinto de guerra. Parecia uma pequena aldeia fustigada por uma dura batalha, mas também continha algo de apocalíptico.
Como o G. referiu, assemelhava-se a um cenário do “Walking Dead”, uns casinhotos destruídos, outros queimados ou invadidos pelas árvores.
Fomos elucidados. Não passava de um antigo campo de treino dos Rangers, que a natureza tinha resolvido tomar conta. Saímos do insólito espaço com a certeza que estes militares levam a sua tarefa à séria.
Um grande pássaro branco desvia a nossa atenção e aterra no pico de uma que parecia nem conseguir suster um pardal.
Mais à frente lá surgiram as vestes camufladas uns metros adiante os rinocerontes. Cumprimentámos os soldados em silencio e ficámos a admirar os dois machos que pareciam encetar uma luta de “Sumo” com os dois “rikshis” a medir as forças.
Mais afastada uma fêmea alimentava-se, serena.
Eu aproximei-me um pouco demais de um dos rinocerontes, para fotografar mais abeirado e ele avançou na minha direcção. Um dos Rangers disse-me para dar uns passos para trás muito devagar. E rinoceronte continuou a sua vida. E eu continuei intacto.
Monday, October 16, 2023
(...) Quando a manada passou o Toyota Rangler seguiu caminho. Mais adiante deparámos com uma mancheia de Zebras que de acompanhavam de Impalas e/ou Kudos.
Cada animal produz um dejecto diferente. Antes mesmo de nos deparamos com os Búfalos já o trilho nos dizia que eles por ali andavam. A bosta é mais nos menos como a impressão digital, embora normalmente maior e mal cheirosa. Mas adiante. Assim como as pegadas - ou as cavidades que provocam na terra. Assim os buracos pela sua forma e dimensão também definem o bicho. E a fossa com que deparámos, mais para dentro da savana, era digna de um Elefante . Assim como as bostas que o animal deixou para que o Toyota Rangler o seguisse. Metemo-nos ao trilho em que a cada elevação se sucedia uma depressão e, aos altos e baixos, fomos observando a vegetação díspar da savana. Grandes embondeiros, árvores de diferentes formas, estreitas, estilizadas ou deformadas, escultóricas. Não é por acaso que o Mia Couto diz que os monumentos em África são as árvores.(...)
Friday, October 13, 2023
Lago Kariba
Fomos a Siavonga, no Sul da Zâmbia, terra dos Tongas, que acolhe o Lago Kariba.
Pretendíamos conhecer a sua imensidão e o local onde se domiciliou a mítica Nyami-Nyami.
Na verdade é o maior lago “fake” do mundo desde que lá ergueram uma barragem.
Agora ostenta 220Km de comprimento, por vezes 40Km de largura e um volume de 180m3.
É verdadeiramente impressionante.
Para além disso é uma cidade piscatória, conhecida pelos lagostins que lá se caçam aos magotes e se vendam (quase) ao preço da chuva. É também um destino turístico em demasia.
O nome Kariba advém de Karibva ou Karinga que significa armadilha, devido a uma rocha que parece querer desabar do topo do desfiladeiro para cair em cima de alguém.
Da rocha que abriga a Nyani-Nyami, segundo professam os BaTonga, ninguém se poderia aproximar, com o risco de serem arrastados para o lago e lá permaneceriam até à eternidade.
A história da Nyami-Nyami que significa Deus-rio pode-se resumir em poucas frases.
O Povo Tonga acreditava que O Deus-rio vivia naquelas águas e os protegia. Que se assemelhava a uma serpente com uns três metros de largura, se saberem calcular o se comprimento. E que quando se banhava no Kariba o lago tornava-se escarlate.
Quando construíram uma represa entre as margens do seu lago Nyami-Nyami ficou separada da sua esposa.
Dizem que e prometeu à amada que um dia destruiria a barragem para se juntar a ela.
A história da Barragem também se pode resumir. O povo BaTonga pouco contato tinha com o exterior e vivia ao longo do rio em plena harmonia coma mãe Natureza, residindo em casas de Krall.
Quando o colonialismo teve a ideia de industrializar a Rodésia do Norte, deu-lhes para ali botar uma barragem, andava-se pelos anos 50, chamaram uns italianos para fazerem a obra.
Como uns milhares de árvores centenárias se atravessam nos caminho da modernização, arrancaram-nas. E os trabalhos progrediam.
Entretanto as águas da barragem iriam transbordar e alagar as casas da população BaTonga, Convidaram-os a afastarem-se do rio.
Mas como há sempre pessoas teimosas e agarradas materialmente ás casas em que sempre viveram, houve uns quanto que, benemeritamente, foram retirados à força.
No ano de 1957 a barragem estava prestes a finalizar-se. Nyami-Nyami encolerizou-se e provocou as maiores cheias jamais vistas. Parte da barragem ficou destruída e muitos trabalhadores morreram. Alguns eram brancos e foram os corpos destes que, enigmaticamente, sumiram.
No ano seguinte Nyami-Nyami voltou a investir e causou mais danos à estrutura.
Mas a modernidade não pode perder a face e em 1958 lá terminaram a coisa.
Os BaTonga que ainda vivem próximos do rio ainda esperam por um novo regresso do Deus-rio.
Thursday, October 12, 2023
MEMÓRIAS DE GUINÉ BISSAU
Bijagós. O arquipélago, composto por oitenta e oito ilhas, encontra-se povoado por divindades e espíritos ancestrais. Em certas ilhas, como Rubane, é interdito derramar sangue no chão ou enterrar cadáveres, humanos ou outros.
Árvores colossais emergem da selva onde proliferam pequenas cobras fatais e hostis jibóias, mas também gafanhotos multicoloridos ou rãs de meio metro.
Ademais macacos, hipopótamos, crocodilos, aves pernaltas, tartarugas marinhas e lontras por lá comperecem.
ano 2020
Partimos do porto de Bissau depois das 15h.
A lancha rápida que nos transportaria até Punta Achaca, o nosso destino, enchia, pelo que fomos informados, aos 6 passageiros adultos.
Dois tardavam em comparecer e o condutor não se encontrava muito motivado para alevantar a âncora sem a embarcação completa.
Dado o impasse encetamos uma pequeno motim e a partida não se delongou muito.
Prosseguimos pelo vasto canal de Gêba.
Percorridas umas quantas milhas, avistámos um marco, que os portugueses ergueram indicando as direcções das principais ilhas do arquipélago dos Bijagós.
O barco atravessa o mar em pequenos saltos embatendo na água, que resistia, espalhando centenas de pingos frescos nas nossas faces.
Pelo caminho fomos distinguindo as ilhas de Maio, Formosa, Bolama, Galinhas. Quando nos aproximamos, as ilhas traziam-nos odores frescos de quietude.
Aportámos ao fim de uma hora e meia na praia paradisíaca de Rubane, abeirada de Bubaque. Desencalhamos num areal desocupado e magnífico.
Fomos muito bem recebidos, com uma simpatia que se prolongou até o término da estadia. Assim como ficámos bastante bem instalados. Acolheu-nos uma casa espaçosa de madeiras e cana, com uma aprazível simplicidade, que aspirava, com sucesso, metamorfosear-se com a paisagem.
O mar, o vasto areal, a emérita variação de arvoredo. Assim como a quantidade de aves, especialmente os falcões, que voavam rente a nós para de imediato se encontrarem junto às palmeiras altivas aparecendo e desaparecendo entre as folhagens, emprestam à ilha uma sensação vestal.
Mas quanto mais virgens e edénicos os mares se querem, mais traquinas se apresentam para lesar um belo fim-de-semana.
Desta feita foi sob a forma de um peixe-aranha ou, talvez, uma raia.
Nadávamos eu, o G e a M, a uma longa distância do centro populacional, que compreendia uma vintena de pessoas, a cerca de 2 quilómetros.
Enquanto flutuávamos, boiávamos ou esboçávamos algumas braçadas animadas, um inconveniente grito lancinante privou-nos da reinação. De um lado achava-se a M, do outro encontravamo-nos eu o G. A meio, uma senhora que se dera ao mar, bradava horrores. Anúncios de algo grave.
Precipitámos-nos sobre ela. Ao chegar deparámos com a impossibilidade de a levantar, embora se encontrasse nas primeira linhas das ondas, o peso da senhora era muito considerável.
Acrescentava à dificuldade o corte que o animal forjou na planta do pé, que a impedia de o assentar.
O volume e peso, acrescido da ondulação marítima só contribuíam para o desequilíbrio.
Como a senhora teimava em querer desfalecer a atrapalhação era considerável.
Conseguimos, ainda assim, mantê-la semi-levantada até que o marido surgisse.
As dores deveriam ser verdadeiramente fortes pois a agonia já era proclamada ao Altíssimo. Compareceu, por fim, o Barmen-Dançarino-Bijagó-Enfermeiro que, com uma seringa-ampola retirou o veneno oferecendo-lhe o alívio Divino.
A senhora e o marido agradeciam repetidamente. O que não se me afigura muito correto.
E quanto mais o faziam mais me parecia que deveria ser o inverso.
Tendo em conta que a senhora teve a fineza de ser picada e, com isso, nos ter alertado para a existência de tais alimárias naquelas calmas águas, seria da nossa obrigação regraciá-lá, pois retirámo-nos das águas de imediato. Incólumes.
Em suma o fim de semana correu lindamente. Até nos foi oferecida a oportunidade da prática de uma boa ação, o que fica sempre bem.
Sunday, October 8, 2023
(...) Dêmo-nos como satisfeitos e o Toyota meteu-se no trilho para regressas ao Lodge. Holofote, no entanto, não deixou de apontar para o mato. Inesperadamente o foco revela uma leoa entre as folhagens, mesmo ao nosso lado na berma. O Toyota recuou, a fêmea observo-nos e embrenhou-se por entre o arbustos. O Guia explicou-nos que ela estava a caçar e voltaria a surgir. Assim foi. Momentos depois a leoa entra no trilho mesmo à nossa frente. A escuridão era quase total, apenas o halo de luz provocado pelo holofote nos permitia visualiza-la. E seguimo-la lentamente enquanto caminhava calmamente adiante de nós. Por vezes o Toyota parava para que o animal não se sentisse ameaçado. Depois embrenhou-se na selva e o foco seguiu-a enquanto pode.
O safari não podia ter terminado de forma melhor forma. À noite, no meio da selva a perseguir uma leoa.(...)
Saturday, October 7, 2023
Quando cheguei a Lusaka deparei com estas estruturas que se espalhavam pela cidade .
Calculando que o Damien Hirst ou outro artista dado à criação de instalações artísticas não tivesse percorrido a capital Zambiana, a plantar obras, fiquei intrigado com aquela armação coroada de luvas.
Após questionar alguns locais fiquei a perceber que o propósito destas criações pouco tinham de artístico. Pelo contrário, revelam-se bem mais prosaicas.
As ruas de Lusaka são ladeadas de valas por onde flui muito dejecto que vai desaguar nos esgotos. Como é sabido, a natureza de um esgoto é entupir-se de quando em quando.
E quando isso acontece lá aparecem os trabalhadores, de mãos-a-abanar. Retiram as Luvas lá de cima, executam o seu trabalho e devolvem-nas à estrutura metálica para que os próximos não tenham de arcar com elas.
Resolvido o mistério, continuo a apreciar a sua forma, embora não me aproxime muito da coisa.
Friday, October 6, 2023
Mosi-o-Tunya
(O fumo que troveja)
Ficámos molhados como uns pintos. Aliás devo confessar que até o pinto ficou encharcado.
A maior parte do tempo é como ser estivéssemos debaixo de uma chuva incessante com gotas da espessura de um alfinete, daqueles compridos não dos ditos de dama. Mas às dadas tantas a aguada agudiza à séria e ficamos com a sensação de que temos uma enorme nuvem que resolveu deitar tudo o que tinha dentro de si cá para fora.
Julgo que a Catarata funciona mais ou menos assim.
O rio Zambeze vem muito rápido e salta a pique lá do alto dos seus 128 metros, na garganta do Kariba, e desce barulhento por ali aos trambolhões entre as rochas até desaparecer lá no fundo, já perto do infinito.
O impacto é tal que uma névoa gigantesca faz a viagem inversa e ainda sobe umas dezenas de metros acima da catarata para depois cair sobre as nossas cabeças, enquanto observamos embasbacados aquela que decidiram merecidamente ser uma das 7 maravilhas do Mundo.
É essa nébula que á distância se torna igual a um gigantesco fumo. Aliás, lá dos céus, quando nos vamos aproximando de Livingstone já se vislumbra o fumo da catarata que troveja.
O arco-iris gosta sempre de marcar presença naquela imensidão de beleza.
Não admira. Luz branca há aos montes e não faltam gotas que queiram fazer a sua reflexão sobre a refração da luz e acabam por se dispersar naquelas sete tonalidades que bem conhecemos.
Quando o Sol aparece, à hora que costuma desabrochar em África, vai tingindo o céu de laranja-avermelhado e colorindo destes tons as partes da cascata que entende ficar melhor. Aí a o quadro fica perfeito.
O Astro sempre sempre teve muito jeito para pintar céus.
Mosi-o-Tunya, ou Mosi ao Tunya, o nome que os ancestrais deram ás cascatas que se estendem por 1,7 quilómetros, sendo a maior do mundo em largueza (em altitude ganha o prémio a “Salto de Ágel” na Venezuela, contando 979 metros) e fica metida no meio dois países, Zâmbia e Zimbabwe.
O brado que produz e o “fumo” que emite ter-lhe-ão valido o nome, O fumo que troveja.
Livingstone, explorador Escocês, andou por África à procura de rios. Arrancou do Botswana, viveu com povos, como o dos crocodilos ou o povo dos macacos, atravessou meia África e o deserto do Kalahari até chegar ao rio Zambeze para lhe atribuir o nome desengraçado de Victória Falls e deixar cair o poético Mosi-o-Tunya.
Pelo caminho foi atacado por um Leão, foi dado como perdido, dado como achado e acabou por morrer a 1 de Maio de 1873 na actual Zâmbia depois dei ter perdido a sua caixinha de medicamentos.
Mosi-o-tunya, era um local sagrado para os antigos. Eles acreditavam que no lago Kariba, no rio Zambeze, habitava uma grande serpente. Nyami-Nyami, que significava Deus-Rio e nunca deveriam entravam nele.
Criam que essa criatura que se assemelhava a uma serpente tinha três metros de largura, mas não se atreviam a adivinhar-lhe o comprimento. Apenas sabiam que quando Nyami-Nyami lá nadava a água tornava-se escarlate.
Mas à grande serpente também foi reservada uma história de amor. Só que já mais perto dos nossos tempos nos anos sessenta do século passado, quando construíram uma represa entre as margens do rio. Diz-se que Nyami-Nyami ficou separada da sua esposa e prometeu à amada que um dia destruiria a barragem para se juntar a ela.
Pelo que sei ainda não honrou a promessa.
Para on Povo Tonga Nyami-Nyami, era a sua protectora.
Ainda hoje este locar está envolvido num certo misticismo.
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Cesário verte Escritor desalegre por (sua) natureza. Andava pelas ruas, ao anoitecer, melancólico entre as sombras e a maresia do Tejo...